Ou com pena da pessoa, por ela ter um motocubo…
Antes de mais nada, gostaria de ressaltar que tenho vivido um momento novo em minha vida: estou, finalmente, em liberdade. Não que eu estivesse confinado atrás das grades usufruindo dos bônus e ônus que o sistema prisional brasileiro nos proporciona.. na verdade eu estava preso na cadeia que prende a milhões de nós: o emprego. Enfim, saí do trabalho (ou da estrutura física dele) para continuar fazendo o que eu fazia, porém do aconchego do meu lar. Sei que minha felicidade com isso durará até chegar a primeira conta de luz, mas enfim… Hoje eu fui fazer o exame demissional, algo necessário pra se oficializar a saída da empresa.
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Exame demissional é uma parada, digamos, constrangedora tamanha a inutilidade da coisa. Você entra, diz “oi”, a médica fala “oi, tudo bem” e se você responder “tudo bem sim” ela diz “que bom que está bem” e mete o carimbo de APTO lá. Mas burocracia é isso aí e eu tive quer ir fazer o famigerado exame.
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Vou cortar meu diálogo na estação de trêm com um desconhecido, apesar de ter sido chocante tudo o que falou.. vou direto ao ponto chave da postagem: chegando na estação botafogo, ao subir a escada, vejo um objeto quadrado no chão, meio brilhante.. me abaixo e pego… e por instinto quase taco-o de volta à terra no mesmo instante: Era um celular motocubo.. o modelo novo da motorola que causa vergonha alheia em quase todo mundo que entende de tecnologia.. mas que as meninas adoram. Motocubo é o Jonas Brothers dos telefones celulares.
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Meu segundo impulso (já que resisti ao desejo de destruí-lo) foi esconde-lo e sair correndo… na condição de nascido em favela, filho de negro e pobre ad aeternum, seria bem normal fazer isso, mas venci novamente a tentação..
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Estava atrasado para a “consulta” e simplesmente deixei o telefone ligado na minha mão, esperando alguém ligar pra caça-lo… ninguém ligou e o medo começou a me consumir: “Será que vou ter que ficar COM ESSA BOSTA PRA MIM?”, me questionava já com calafrios.. ao mesmo que já imaginava pra quais garotas eu poderia dar o aparelho, já com segundas intenções.
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Acabou a consulta, resolvi olhar a agenda (fui educado o suficiente de não olhar os sms…) e não achei “casa”, o número padrão pra se ligar quando se acha um cel… mas tinha lá um “mãe”. ok, vamos ligar… ligo, e então…
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“Seus saldos são insuficientes para completar a chamada”. OK. então você quer um celular bonito, que chama atenção pra NÃO TER CREDITOS PRA LIGAR, é isso mesmo? Enfim…
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9090 na frente do número”mãe” e vamos ligar novamente (toda essa trama rolando durante minha caminhada na Voluntários da Pátria)… e, musiquinha tocando, ela diz “oi, grazi”.. e eu, sem graça, falo.. “oi, desculpa… me chamo Renato e acabei de achar esse celular na saída do metrô de botafogo”.
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Tentei impor seriedade e desconserto a voz , tirando qualquer traquejo de malandragem, pra não pensarem que eu seria na verdade um ladrão de telefones.. e a mãe da Grazi “ah, peraí que eu vou passar um rádio pra ela.. ela estuda aí perto do metrô”.
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10 minutos depois, sob o sol forte que ardia na zona sul do Rio de Janeiro, e o bocó aqui esperando no lado de fora do metrô, o motocubo toca eu olho para atender. No mesmo instante, uma figura magra e sem sal, de uns 20 anos, sorri pra mim e diz “oi, Renato.. é a Graziela”. Devolvo o aparelho e ela sorrindo agradece toda hora e pergunta “posso fazer algo por você?”. Deixo o cerimonialismo de lado e falo “Sim, um açaí cai bem nesse calor”. ela ri, nos dirigimos a uma barraquinha ao lado do metrô, ela me dá o copo de açaí e quando eu achava que pararíamos pra conversar, ela diz tchau, agradece novamente e sai andando.
Conclusões:
1- Homem que é homem não tem um motocubo. falar que não quer te-lo porque sua velocidade de navegação é edge, desprovido de hsdpa e wi-fi não cola. Homem não usa motocubo porque é celular DE MENINA
2-Você nunca pegará ninguém porque achou o celular da pessoa
3-Tenho pena da Grazi não por ela ser magra demais, sem sal e possivelmente só fica com colegas da internet, mas porque ela tem UM CELULAR HORRÍVEL.